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Belo Horizonte e as bicicletas: pedalar na cidade é possível

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Belo Horizonte e as bicicletas: pedalar na cidade é possível
Massa... Crítica! Foto: Facebook Massa Crítica BH.

Sou nascido em Belo Horizonte, onde moro atualmente. Dos meus trinta e poucos anos de vida, a grande maioria foram vividos aqui (4 anos no Espírito Santo, outros 2 no Rio de Janeiro, pra amenizar o “vício de praia” que acomete os bons mineiros). Em todos esses anos, e especialmente nos últimos 13, quando passei a utilizar a bicicleta regularmente como meio de transporte, tenho visto algumas “verdades absolutas” da vida nessa cidade rolarem ladeira abaixo. E porque não dizer ladeira acima também.

"Essa é a ladeira da preguiça..."
“Essa é a ladeira da preguiça…”

Ah, as ladeiras de Belo Horizonte! Os amigos do Rio de Janeiro, quando vem me visitar, sempre se espantam. Na verdade nós chamamos de morros, mas pro carioca morro é outra coisa. Ladeira ou morro, fato é, que sempre disseram que eles eram o grande obstáculo para que o uso da bicicleta não fosse estimulado na cidade.

Há alguns anos atrás era até difícil dizer “Belo Horizonte e as bicicletas”. A voz embargava, gaguejava, pensava-se duas vezes. E logo surgiam os estudos, os especialistas, as pesquisas, todas condensadas e resumidas na seguinte frase que partia – dessa vez, sem titubear – da voz de mais um algoz das magrelas: “Belo Horizonte não possui o relevo propício para usar a bicicleta”.

O velho mimimi: "Belo Horizonte não possui relevo propício para a bicicleta"
O velho mimimi: “Belo Horizonte não possui relevo propício para usar a bicicleta”

Pronto. A frase decretava o fim da discussão. Mas por que o famoso “ali de mineiro”, onde o longe vira perto, nunca serviu para as bicicletas?

Só que havia um detalhe, uma constatação, talvez até um sentimento universal, que aflora em qualquer lugar por onde ande uma bicicleta. Seja no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte, ou em qualquer lugar do mundo; seja no asfalto ou na terra,  morro acima ou morro abaixo:

Andar de bicicleta é bom demais da conta!

"Olha mãe, sem as mãos!"
“Olha mãe, sem as mãos!”

Recorro ao “mineirês” apenas para mostrar que nós, moradores de Belo Horizonte, que sempre gostamos de pedalar, assim o fizemos por todos esses anos. A despeito do discurso anti-bicicletas na cidade, pedalamos desde sempre. Quando a situação era desfavorável, o fazíamos de forma silenciosa. Mas agora, chegou a hora de fazer barulho.

Para que a bicicleta saísse dessa condição de “extra-terrestre” e começar a fazer seu filme na cidade, entraram em cena justamente elas, as ladeiras. Mas não na cidade propriamente dita, e sim, nas trilhas. O mountain bike sempre foi prática forte em BH e seu entorno. E eram muitos desses praticantes que também colocavam suas bikes no asfalto de Belo Horizonte durante os dias de semana. Além deles, trabalhadores, que por necessidade ou opção utilizam suas bicicletas como meio de transporte passaram a  enfrentar o trânsito da cidade proibida para as bikes.

E.T. - O Extraterrestre
Ciclista em BH: como os outros veem.

Junto a isso vieram outras ações. Grupos de pedal noturno, movimentos mundiais como a Massa Crítica, além dos meios de comunicação (especialmente a internet) que permitiram maior visibilidade e troca de experiências entre ciclistas de todo Brasil e do mundo alavancaram o uso da bicicleta em Belo Horizonte.

E por último, mas não menos importante, um movimento próprio de BH. Por aqui, as elites políticas que sempre dirigiram a cidade gostavam (e ainda gostam) de vender (literalmente) a ideia de que mineiro “adora receber em casa”, “é caseiro” e blá blá blá. Tudo isso pra não ver as praças e ruas ocupadas pela população (os bares e shoppings podem). Sim, são os mesmos que diziam que Belo Horizonte não era uma cidade para as bicicletas.

Depois de muito viver sob o tédio absoluto, abandonar a cidade a cada Carnaval, e cansados de ostentar o título de “bicho do mato”, eis que surge um outro grupo, formado por pessoas que gostam de se divertir e que queriam (e ainda querem) mudar a cara de Belo Horizonte. Não é de se estranhar que dentro dessa turma que quer “botar o bloco na rua” estejam muitos ciclistas!

Quem não tem mar, vai pra Praia da Estação, em BH.
Quem não tem mar, vai pra Praia da Estação, em BH.

Pronto! De forma bastante simplificada (imagine que tudo isso foi acontecendo ao mesmo tempo) está formado o grande caldo que está colocando cada vez mais bicicletas nas ruas de BH. E “de repente”, o que era uma grande verdade agora já não é mais.

Já encontramos muitas dobráveis, híbridas, urbanas e até algumas fixas, mas até hoje, as mountain bikes ainda são as bicicletas que mais caracterizam o ciclista urbano da cidade. Os grupos de ciclismo cresceram muito, e a noite de Belo Horizonte está repleta de bicicletas, de segunda a domingo, seja com o RUT’s, do Mountain Bike BH, o Le Velo, Pedal da Madrugada e muitos outros ajuntamentos de ciclistas, felizmente já difíceis de serem contabilizados.

Galera do RUT's no mirante das Mangabeiras. Foto: Vinícius Túlio
Galera do RUT’s no mirante das Mangabeiras. Foto: Vinícius Túlio

As novas pesquisas e estudos agora planejam 350 km de ciclovias, que pouco a pouco (bem pouco), vão sendo colocadas em seus devidos – e indevidos – lugares. A cidade acaba de ganhar uma associação de ciclistas urbanos com forte atuação junto aos órgãos públicos, a BH em Ciclo. Tem também o pessoal do Bike Anjo BH, sempre pronto para ajudar a colocar cada vez mais ciclistas nas ruas de forma segura e consciente.

Bike anjo Javert em ação. Foto: Bike Anjo BH
Bike anjo Javert em ação. Foto: Bike Anjo BH

E o movimento não para por aí. A Massa Crítica vem acontecendo regularmente e crescendo o número de participantes a cada edição. E como quem pedala também sabe se divertir, movimentos como o Velódromo Raul Soares, a turma do Bike Polo e das bikes roda fixa (sim, de fixa em BH!) vão ganhando as ruas da cidade. Esse ano teve até bloco de Carnaval com bicicletas, o Bike Fantasy!

Massa... Crítica! Foto: Facebook Massa Crítica BH.
Massa… Crítica! Foto: Facebook Massa Crítica BH.

Mas e as ladeiras? Elas sumiram?

De forma alguma. Na verdade, ela nunca foram o problema. Não eram no passado, e não são hoje, quando as bicicletas confortáveis e cheias de marchas deixaram tudo mais fácil.

Que esse seja apenas o começo da ocupação de Belo Horizonte pelas bicicletas. Ciclistas ou não, queremos todos uma cidade menos careta, mais bonita, e melhor pra se viver.

13 COMMENTS

  1. Estamos, juntos, na luta para tornar BH uma cidade com mais e mais respeitos aos pedestres, aos ciclistas e às pessoas! Belo texto, André.

    A BH em Ciclo lhe saúda.

  2. Parabéns pelo texto! Chegou a hora de fazer barulho!, pedalar pela cidade, reivindicar nosso espaço e melhorar a qualidade de vida de uma sociedade tão dependente de carros!.

  3. Obrigado Gil!
    É muito bom pedalar a tanto tempo na cidade e ver que as coisas estão mudando, ganhando força. Um grande abraço e boas pedaladas!

  4. Claudio Lima, Recifense, torcendo para que as magrelas invadam todos os cantos e recantos dessa país! Abraços aos mineiros, e mineiras é lógico!

  5. é isso aí Man, fino o texto, viva as bikes, viva as praças, viva BH. Viva e viva.
    como disseram pelos carnavais por aí, “chuta, chuta, chuta, chuta a família mineira”

  6. Nó André!!!! Adorei…. Dá até vontade de sair pedalando …..Viva BH e suas praças, suas bicicletas e todo mundo! Bom demais!!!!!
    Beijo

  7. Parabéns pelo texto André. Aqui em Manaus também existem muitas ladeiras (o que vocês chamam de morros), além disso temos o fator SOL. Mas, nada disso é capaz de tirar a força de quem luta pelas magrelas. Quando pequeno vivia alugando bicicleta para passear pela cidade, hoje em dia, já não encontro mais tantos locais de aluguel de bike, e já encontro mais pessoas lutando por ciclovias. De repente, são as mesmas pessoas que quando era pequena alugavam bicicletas junto comigo. Vou aproveitar parte do teu texto para uma outra reflexão que farei no meu site. Mostrarei através do belo exemplo que vocês deram e dão em BH, que também podemos superar esses obstáculos no Amazonas e principalmente em Manaus.
    Abs

  8. Obrigado pelo retorno Marcus. Depois de tanto tempo pela cidade consigo perceber essas mudanças que você mencionou. Fique a vontade para utilizar todo o material aqui do blog. Quando terminar seu texto mande o link pra gente divulgar por aqui ok?
    Grande abraço e boas pedaladas

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