Por Paulo Salvador Sanches
Viagens e aventuras com a bicicleta. 1979 – de São paulo a Buenos Aires
É longa, começou em 1979! Decidi que não ia aguentar a mais ficar horas por dia no trânsito de São Paulo, dentro de ônibus cheios. Morava no Ipiranga, trabalhava na Brigadeiro Luis Antonio, e estudava no Equipe, perto do centro da cidade. Peguei minha carteira assinada, e fui de “busum” até um [supermercado] Jumbo Electro da vida no Sacomã, e sai de lá pedalando uma Peugeot, 10 marchas.
Não tinha ideia que minha vida iria mudar depois desse dia. Não existia ciclovia, todo mundo me achava louco, mas eu virava São Paulo de ponta cabeça, dia e noite. Não demorou muito, São Paulo ficou pequena, não existia mais trânsito nem contramão.
E a primeira viagem pro Guarujá foi debaixo da maior chuva, Estrada Velha em obras, tive que desobedecer ordens de voltar no trecho da Serra, e quase fui preso em Cubatão… Fui várias vezes pro litoral mas sempre de noite. Estrada Velha na contramão porque só podia subir nesse tempo, não sei como é hoje.
Foi passando do o tempo, a bicicleta era (e ainda é) meu principal meio de transporte na cidade. Meus horizontes se expandiram. Fui pra Camburi, São Sebastião debaixo da maior chuva, pela praia depois de Bertioga não existia a Rio-Santos. 11 horas de pedal. Dia a dia fui ficando cada vez mais apaixonado pela coisa.
E numa noite em 1979, meu amigo Piu sugeriu uma viagem pra Argentina no fim do ano. De carona. Algumas cervejas depois, veio a tona a ideia de ir de bike. Aquilo ficou no ar até a manhã seguinte, quando nós dois nos encontramos cedo, empolgados com a aventura. A ideia amadureceu, e passadas algumas semanas, saímos de São Paulo, rumo ao litoral, Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém, Peruíbe, Pedro de Toledo, até a Br 101 (acho que é 101), rumo a Curitiba. Depois seguimos Joinville, Itajaí, Floripa, Torres, Porto Alegre, Pelotas, Rio Grande, Chui, Uruguai, até Montevideo, Colonia, e um barco até Buenos Aires.
Não me lembro direito quanto tempo, mas foi perto de um mês acredito. Nesse tempo a Argentina vivia tempos de ditadura militar, como também o Uruguai e o Brasil. Mas na Argentina ninguém podia ter o cabelo comprido, e fomos revistados e levados pra interrogadores várias vezes. Detalhe até agora não comentado: nós não tínhamos dinheiro nenhum, viajávamos batalhando rango e pousada. Muita fé e coragem na juventude. Nesse tempo o peso argentino era MUITO mais forte que a moeda Brasileira, acho que era cruzeiro nesse tempo. Nós vendemos nossas bikes em Buenos Aires e voltamos pra Sampa de ônibus. Fomos entrevistados por algumas revistas (agora eu só me lembro da Duas Rodas, tenho uma copia até hoje em algum lugar).
Viagens e aventuras com a bicicleta. 1980/81 – de São Paulo a Santiago
De volta a São Paulo e a rotina do dia a dia não demorou muito. Voltei à mesma loja no Sacomã, e dessa vez sai com uma Monark 10. Voltei a estudar e trabalhar, e minha bike era meu transporte. Fins de semana e feriados. Fui pra Ubatuba, 250 km se me lembro bem. 24 horas de pedal. Me lembro de sair de São Paulo as 11 da noite, radial Leste. Moji das Cruzes, não me lembro mais os nomes mas acho que e Paraibuna, descida da Serra pela Estrada da Petrobras atá São Sebastião, maior chuva o dia inteiro, pneus furados, pedais se partindo, foi uma luta.
Bom, minha vida tinha mudado de verdade, e no verão de 1980 não me lembro como, mas a ideia de ver o Pacifico amadurecia na minha cabeça e no começo de dezembro, meus amigos Ronaldo Duarte, e Tadeu Maria Conceição e eu saímos de São Paulo com direção a Ibiuna, Piedade, descemos pra Juquia, estrada de terra, Jacupiranga, BR 101. Saímos do Brasil por Chui, Montevideo, Buenos Aires, Ruta 7 , por Luhan, Junin, Labouialle, Mercedes, Mendoza. Ai veio os Andes, dois Dias subindo, cruza pelo tunnel a 4000 metros de altitude. Descida pelos caracoles, até Vina Del Mar, Valparaiso. Inacreditável travessia das Montanhas. Verão no Chile em janeiro de 1981! Até dar a saudade de casa, e depois de uma semana em Santiago, conseguimos arrumar a grana pras passagens de volta pra São Paulo. 72 horas de ônibus, ano de 1981.
Viagens e aventuras com a bicicleta. 1982 – de São Paulo a Los Angeles (CA)
O verão acabou, a vida batia a porta, eu não sabia o que fazer dela. Fui trabalhar no banco Boa Vista, centro de São Paulo, e depois de ter abandonado a faculdade de Ciências Sociais da USP, voltei a fazer cursinho a noite no Anglo, querendo realmente encontrar um rumo. Mas eu não conseguia ter Paz usando gravata, e não perdia nenhuma oportunidade de sair de São Paulo. E ai veio a ideia de ver a Copa do Mundo na Espanha. Essa ideia me consumir por algum tempo até eu perceber que não existia nenhuma possibilidade de um cara como eu conseguir a grana pras passagens aéreas e ainda se manter na Europa por um mês e tanto. Então o Nardo, o Ronaldo Duarte , falou assim do nada: “Paulão, vamo pros States, lá a gente descola uma grana pra ir pra Espanha”. Eu fui buscar o mapa, fiz pesquisas, fui ver os mapas da Polícia Rodoviária Federal, via Panamericana… E vi que era possível. Eu nunca tinha ouvindo falar de ninguém que fez essa viagem, mas lembro de ter visto na tv um Mexicano nos anos 60.
Bom a ideia nasceu para a viagem pra California. E muitos amigos acharam o máximo, e todo mundo queria ir também. Mas não é assim. Uma travessia dessa requer planejamento e organização, começa pelo passaporte que eu não tinha, e o visto Americano. Não foi fácil. E a grana também. Nas duas viagens anteriores, quase sem dinheiro, isso nunca atrapalhou, porque as pessoas ajudam a quem precisa e tem boa atitude. Mas essa viagem seria MUITO maior do que qualquer outra que eu já teria feito. Eu comecei a economizar. Foi MUITO duro pra minha família e pra mim também, mas vários fatores colaboraram na minha decisão, e depois de tomada, não haveria volta.
Um por um , meus amigos e amigas desistiram da ideia. Eu já esperava por isso, mas de repente só tinha sobrado eu, e eu repensei a coisa toda. Até que meu grande amigo Antonio Vidal Fernandez, o Cacalo, craque de bola, gente fina, passou em casa uma noite e disse que iria junto comigo. Eu sabia que o cara era de fé, o lance é que ele nunca tinha tido uma bicicleta na vida. Nem sabia andar de bike. Gigante descolou uma Peugeot brasileira, e começou a andar. Me lembro de dois tombos espetaculares, um no museu do Ipiranga, outro perto do poço do Jaraguá.
30 de janeiro de 1982, um domingo de manhã cruzamos o Parque do Ibirapuera, a galera nos seguindo, pra Ibiúna, Sorocaba, Itapetinga, Ourinhos, Presidente Prudente, Campo Grande, Corumbá. Trem da morte pra Santa Cruz de la Sierra, Cochabamba, La Paz. Cordilheira, Puno. Já no Peru. trem pra Arequipa.Pacifico. Pisco, Ica, Lima, Trujillo, desertos, equador em cima do trem que faz zig-zagues de volta pras Montanhas… e que Montanhas… até Quito. Montanhas magnificas, inacreditável descida ate Cali, na Colômbia, e depois Medellin. Norte da Colômbia até Turbo. Fim da estrada.
Daí, só de barco até Sapzurro, fronteira com o Panamá, Puerto Obaldia, algo assim.
Encalhados e sem grana no meio das Américas, conseguimos depois de muita sorte embarcar num avião pequeno até Panama City. Lá recebemos uma grana, descolamos, rodas, corrente e catracas novas. Já havíamos trocado as correntes em Quito também. Com as magrelas reformadas, limpos e com uma merreca no bolso, cruzamos a Costa Rica e Honduras. Tivemos que desviar de El Salvador porque estavam em guerra e os caminhoneiros nos disseram que nos não passaríamos. San Pedro sula não e um lugar agradável.
Até Guatemala City, pension meza onde Che Guevara se hospedou. Costa do Pacífico até Tapachula no sul do Mexico, onde vimos o Brasil perder da Itália com 3 gols de Paolo Rossi. Ficamos tão desolados com a derrota que ficamos uma semana em Puerto Escondido, pegando ondas, até criar coragem pra subir de Acapulco pra Cidade do México. Outro planeta. Por Guadalajara, Norte do México, Puerto Vallarta, Chihuahua, um calor infernal. Até a fronteira, Mexicali foram exatos 6 meses de viagem.
Cruzamos , tínhamos 15 dólares entre nós 2 e eu não falava uma palavra de inglês. O Cacalo tinha feito um Yazigi da vida e entendia alguma Coisa. Até San Diego, onde ficamos maravilhados coma limpeza e organização. Foi um choque cruzar do Norte do Mexico pra California. Nunca vou esquecer a sensação.
De San Diego pra Los Angeles, dormindo em Laguna Beach, num templo Hare Krishna com direito a café da manha. Dessa história se passaram mais de trinta anos… Tenho muitos outras histériaas: viagem pra Jamaica, viagem pra Cabo San Lucas, Portugal e Espanha. Outra viagem pra Argentina desde Porto Alegre em 1990. Hoje tenho 4 filhos, Moro na ilha do Hawaii, tenho minha Caloi 10 até hoje, só tirei os câmbios.
O que eu tenho a dizer – se alguém quiser saber – é que nada é impossível.
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Grande Paulão, tudo tranquilo?
Aqui é o Lessandro, sobrinho da Nara e do Maurício. Estávamos aqui na casa da tia Nara conversando sobre a Califa e falando do “louco”, vulgo Caramujo, e acabamos falando de todos daí. E então, como vão as coisas? Mande notícias… ah, meus tios estão mandando um abração pra você. Forte abraço!