Por Maria José do Nascimento
Tenho 53 anos. Durante muito tempo, tive uma situação financeira confortável, mas perdi meu emprego no banco e, em seguida me divorciei, ficando com cinco filhos menores de idade e tendo que sobreviver com um salário mínimo e a pensão que o ex-marido pagava para as crianças.
Com o dinheiro curto, comprei uma bicicleta simples para me deslocar para o trabalho e economizar o dinheiro que seria gasto com passagens de ônibus. Quando minha irmã falou que seu filho (meu sobrinho) ia até o centro da cidade de bicicleta (percorrendo uma distância de mais de 15 km) achei incrível e, aventureira, já me vi tentada a fazer o mesmo.
Não demorou muito e lá vou eu para o Centro de bicicleta. Foi um percurso fácil para mim, já acostumada a andar sempre com minha bicicleta abarrotada de compras e produtos de limpeza que eu vendia, o que me conferiu força e resistência. Entusiasmada com esta primeira vitória, já me animei a fazer percursos mais longos. Então, passei a ir à praia, à casa das amigas, ao médico, supermercado de bicicleta. Adotei este veículo como meu meio de transporte oficial, só o abandonando quando se tratava de uma emergência médica ou quando ia a um local onde precisava ir de vestido e salto alto. Os amigos se surpreendiam ao me ver percorrer longas distâncias a bordo de um transporte alternativo tão incomum entre eles, mas eu não me incomodava. Achava gostoso me deslocar ao mesmo tempo em que me exercitava, apreciava o ganho de tempo nas viagens, o fato de poder fazer meu próprio percurso, no ritmo desejado.
Passado alguns anos, pesquisando na internet e, através de conversas com amigos, descobri que alguns grupos de ciclistas na cidade percorriam longas distâncias de bike. Amante da adrenalina, já quis participar e foi assim que entrei para a Associação Alagoana de Ciclismo (AAC) em 2011, onde fui orientada a comprar minha primeira bicicleta de alumínio e me lancei nas trilhas. Todo sábado era sagrado para mim: passava as manhãs na maior carreira para me desocupar a tempo de, à tarde, me embrenhar nos matos com meu grupo em cima de uma “magrela”. Vendo meu desempenho, os dirigentes da AAC me convidaram para participar do Prodesafio Internacional de Ciclismo, uma sequencia de provas ciclísticas preparatória para o Desafio Internacional de Ciclismo. Sagrei-me campeã geral feminina no Prodesafio e conquistei o 4º lugar no Desafio. Foi uma glória para mim, principalmente por ter sido minha primeira experiência deste tipo e estar concorrendo com pessoas mais jovens.
No final de 2011, fiquei sabendo que haveria uma Bicicletada Nacional por ocasião da Rio+20, com o objetivo de divulgar o uso da bicicleta e alertar os cidadãos, autoridades e mídia sobre a urgência de se implementar medidas que favorecessem os que optaram pela bicicleta como meio de transporte e lazer. Virei cicloativista. Convidei um amigo confiável e experiente, pedi ajuda à AAC, corri atrás de patrocinadores, vendemos rifas, ganhamos bicicletas novas: Samciclo doou a de Lucivaldo e Sllalom Bike, a minha (uma linda Specialized) e, em maio de 2012, partimos para uma viagem de 2.200 km em cima de nossas bicicletas.
Fomos de Maceió ao Rio de Janeiro, levando nossas próprias bagagens e sem carro de apoio; em uma viagem que durou 28 dias, mas com apenas 18 dias de pedal para chegarmos ao nosso destino. Os dez dias de parada foram para comprarmos mantimentos, dar entrevistas e para não chegarmos muito cedo ao Rio de Janeiro, por conta dos preços de hospedagem estarem muito altos devido à grande procura de vagas por conta da Rio + 20. Precisávamos chegar na data da saída dos técnicos do IMA do hotel onde estavam, pois ocuparíamos a vaga deixada por eles. Foi uma deliciosa aventura, regada a muita adrenalina, superação, diversão, companheirismo, novas paisagens, novos amigos e muitas entrevistas (rádio, TV, jornal, sites).
Ao chegarmos em nosso destino, fomos aclamados como heróis pelos outros participantes do movimento e assediados pela imprensa local, afinal fizemos o maior percurso e em tempo recorde. No Rio de janeiro, nos juntamos a parte do grupo da Bicicletada e a um novo amigo carioca para subirmos o Cristo Redentor no pedal. Um grande esforço, recompensado pela bela paisagem, pelas fotos e pelo prazer de nos superarmos sempre. Participamos da Bicicletada Nacional, a qual saiu da Candelária, circulou por vários bairros da cidade, passou em frente ao local onde estava ocorrendo a reunião da Rio+20 e se encerrou na Praça da Lapa, após termos chamada a atenção nos locais por onde passamos bradando palavras de ordem em favor do uso seguro e indiscriminado da bicicleta.
No dia 23 de junho, embalamos nossas bicicletas e organizamos nossas bagagens. No dia seguinte, logo cedo, pegamos um táxi em direção ao aeroporto e embarcamos às 6:00 h rumo à Maceió. Chegamos perto de meio dia e uma galera de ciclistas e familiares nos aguardavam para matar saudades e parabenizar pelo grande feito. Recolocaram os pneus da minha bicicleta que haviam sido retirados para caber na caixa e vim do aeroporto até em casa pedalando com a galera, afinal, já estava sem minha magrela desde o dia anterior pela manhã…
Muito legal a tua história. Parabéns e que você continue influenciando as pessoas à tua volta.
Quando vier a Curitiba, vamos pedalar juntos.