Por Paulo Roberto Palombo Pruss
Conto a história de uma amigo, já contada no Perfil que mantenho do Facebook – Porto Alegre Personagens.
Da Glória de Bicicleta pelo Mundo.
Verão de 1979, no Bairro da Glória em Porto Alegre, calor, a gurizada ficava nas esquinas conversando até tarde, cada turma tinha a sua esquina, era tranquilo. Nas esquinas da Rua Marechal Mesquita, com Sergipe, o papo rolava solto, muitas bicicletas encostadas nas paredes, era o auge das Caloi e Monark 10, os conhecidos camelos. Chega para roda Luis Gustavo Birgmann Gonçalves, o Tubarão, com sua bicicleta, dizendo que vai sair com ela pelo Brasil. As gozações foram muitas, ele aumentou Brasil não, pelo mundo, as risadas também aumentaram, – vai ser agora mesmo, vou em casa pego algumas coisas e me arranco, ainda apareceu na esquina de mochila e um chapéu pendurado (poucas coisas) e se foi.
Ninguém levou muita fé, o fato é que o Tubarão desapareceu, passado algum tempo começou a circular na turma uma revista especializada em motociclismo e bicicletas com uma reportagem com o tubarão, era Março de 1979, ele estava em São Paulo em direção ao Rio de Janeiro, queria chagar a Belém do Pará.
“Luis Gustavo saiu de Porto Alegre e pretende chegar a Belém do Pará com “Brigitte” sua bicicleta de 10 marchas”.
Luis Gustavo, que já conheceu todo o Brasil de carona, acha que ir de bicicleta de Porto Alegre (RS) a Belém do Pará (PA) aproximadamente 7.000 km – mostra que esse veículo pode percorrer longas distâncias, como qualquer outro, só que devagar.
“Quando criança, meu avó contava a história de uma alemão que veio de sua terra natal até o Rio Grande do Sul, sempre de bicicleta, desde então tenho vontade de fazer a mesma coisa” Há dois anos atrás, com 18 anos comprei uma Monark Crescent e descobri que faltava apenas a oportunidade para iniciar minha viagem. Dia 16 de janeiro deste ano senti que era hora de partir. Arrumei minha mochila com algumas roupas, um cobertor, um saco de dormir, uma chave sextavada e um estojo de remendos para os pneus, sai de Porto Alegre com 200 cruzeiros no bolso. Prometeu que jamais pegaria carona, contou os problemas as dificuldades, os erros nas estradas e até roubos. Porém com seu “papo” consegui muitas amizades e comidas por esse Brasil a fora.
“No começo da Dutra em direção ao Rio, fui parado por um policial rodoviário federal, minha sorte melhorou, pois me deram uma carta de recomendação para outros policiais, caso tivesse alguma dificuldade, também consegui que a Monark arrumasse a minha “Brigitte” fazenda uma revisão total e deixando-a praticamente nova”
“Passei à noite na casa de amigos, que conheci neste mesmo dia e na manhã seguinte continuei para o Rio bem mais animado. Pretendo seguir pelo litoral, passando pelo Rio de Janeiro, Vitória, Salvador, Recife e outras cidades litorâneas até chegar a Belém, o que deverá ocorrer em um mês. Também não me preocupo, pois qualquer lugar é bom, dependendo apenas de nosso estado de espírito”.
“Pô o cara consegui” foram muitos os comentários outros discordavam, falou que “ia pelo mundo”, as discussões, os prós e contras seguiam com suas teses que durou alguns dias, até a vida voltar ao normal. O tempo passando, a turma mudando, uns casando outros se mudando e assim por diante, até que dois anos depois a manchete da Zero Hora de 12 de julho de 1982 no segundo caderno. “Gaúcho saiu de bicicleta de Porto Alegre e já está em Nova Iorque” será que era o Tubarão, não podia ser, vamos ler logo a matéria.
“Gustavo Bergmann saiu de Porto Alegre de bicicleta, atravessou a América. Em Nova Iorque está se defendendo como mensageiro, juntado dinheiro para continuar a viagem em volta do mundo, que projeta concluir com o retorno a Porto Alegre daqui a quatro anos.
Verão em Nova Iorque não é difícil conseguir emprego de mensageiro, a tarefa é simples, fazer entregas no centro da cidade, e o melhor pode ser de bicicleta.
– A viagem não tem sido fácil, no Pantanal Matogrossense tive que atravessar com a bicicleta nas costas por que não havia condições de pedalar, na Bolívia eu não consegui emprego nenhum, nem no Peru. Mas em compensação, quando eu peguei a Pan Americana, a estrada pelo menos era melhor e isto já alegrou um pouco mais o meu coração. No Equador trabalhei colhendo bananas naquelas fazendas, foram meses ótimos, tranquilos e felizes, com aquela gente calma e amiga. Na Colômbia lavei elefantes num circo. Na Nicarágua as autoridades só me deram três dias. Em El Salvador, Gustavo enfrentou problemas, com a revolução interna o povo ficava muito desconfiado de estranhos, ainda mais um ciclista de mochila nas costas, empoeirado da estrada, sem uma ideologia bem definida nem maiores explicações sobre os motivos que o levaram a El Salvador.
– Os jovens de lá nem sabem o que é viajar, curtira a vida, a poeira deles não é da estrada é da guerra. Além disso sua condição física, louro de olhos azuis aumentava a desconfiança. O melhor da América Central foi o Panamá muitos amigos, tanto que até bicicleta nova ganhou. O México também foi maravilhoso eles adoram os brasileiros. Conta que era festejado em cada cidade que chegava, cada bar que parava tinha sempre conversas até altas horas da madrugada. Nunca faltou um bom prato de comida, uma cama e um grande papo.
Na Califórnia cortei madeira e assim foi contando sua aventura dizendo que mais ia ter no livro que estava preparando, e também se preparando para ir ao Canadá e Alaska, tinha ganho um cachorro para acompanhar de um chefe índio no México.
O objetivo final era a África do Sul, de lá pego um navio para a Terra do Fogo de lá eu subo para Porto Alegre, até lá vou fazer o que eu mais gosto, “pedalar livre, fazendo parte da paisagem”.
Faz tempo que não aparece uma reportagem ou noticias do Tubarão, por onde andas?