Por Sebastião Filho – Grupo Os Zuandeiros
Na sessão imperial de 11 de setembro de 1859, D. Pedro II registrou: “para melhor conhecer as Províncias do meu Império, cujos melhoramentos morais e materiais são alvo de meus constantes desejos e dos esforços do meu governo, decidi visitar as que ficam ao norte da do Rio de Janeiro”. Impulsionado por sua curiosidade intelectual e social, o Imperador realizou muitas viagens, e, quanto a esta, fez registros elogiosos a cachoeira de Paulo Afonso, seu principal objetivo.
A comitiva imperial viajou por 134 dias, percorrendo as Províncias do Norte, hoje Nordeste brasileiro. O monarca e seu séquito partiram do Rio de Janeiro, aportaram por alguns dias em Salvador de onde seguiram e adentraram pela foz do Rio São Francisco em direção à cachoeira de Paulo Afonso. No caminho visitaram diversas cidades ribeirinhas, totalizando 220 km de barco e 87 km por via terrestre.
O nome Paulo Afonso foi dado a cachoeira em homenagem ao sertanista Paulo Viveiros Afonso, que explorou a região na primeira metade do século XVIII, tendo recebido em 1725 uma sesmaria na margem esquerda do rio (hoje Alagoas), porém, ocupou também uma parte da margem direita, fundando nesse local um arraial denominado tapera de Paulo Afonso.
Foi neste contexto de história e beleza que nós (grupo de amigos abaixo relacionado, a maioria integrante do Grupo Zuandeiros – Aracaju (SE)) resolvemos fazer essa rota, pela segunda vez, de forma autônoma, no período de 10 a 15.10.2017. Os aventureiros ciclistas desta segunda edição foram:
- Alberto Silva
- Ana Cândida
- Chico Dantas
- Everton Menezes
- Fábio Menezes
- Fernando Barreto
- Gilton Melo
- Hercélio Meneses
- Jaqueline Oliveira
- Maiana Pessoa
- Marjorie Tatiana
- Max Maia
- Omar Aguiar
- Pedro Viegas
- Sebastião Filho
Planejamos pouco, como em outras cicloviagens, e mergulhamos, mais uma vez, de corpo e alma no caminho, apreciando suas belezas, paisagens diferenciadas, admirando sua fauna e flora, e, primordialmente, mantendo uma agradável interação com a prestimosa população do interior nordestino.
Partimos de Aracaju (SE), dia 10.10.2017, por volta das 6:00h, com destino a Piaçabuçu (AL), num total de 122 km, sendo 3 km de balsa (Brejo Grande (SE) – Piaçabuçu (AL) / R$ 5,00 por pessoa). Passamos por Pirambu (SE) e almoçamos no Povoado Tigre. Uma culinária tipicamente interiorana, saborosa e com um preço justo (R$ 20,00 / pessoa).
Este primeiro dia foi marcado por algumas quedas, vários pneus furados, problema num bagageiro e, principalmente, pela queda, num trecho de areia, do amigo Omar, que fraturou a cabeça do úmero e teve que antecipar seu retorno para a capital. Foi uma ausência sentida por todos: Omar, um dos fundadores do Grupo Zuandeiros (que em 2018 completará 10 anos), é um companheiro muito querido. Ao chegarmos em Piaçabuçu, pernoitamos na Pousada Santiago (R$ 60,00 / pessoa), posicionada de frente para o Velho Chico, de onde contemplamos um lindo pôr do sol.
No dia seguinte, logo após o café da manhã, partimos com destino a Propriá (SE), distante 69 km. Passamos por Penedo (AL), uma formosa cidade, com um centro histórico bem conservado, muitas construções antigas e, merecidamente, apelidada de “A Joia do Velho Chico”.
Continuando revisitamos os Povoados de Marizeiro, Cajueiro, Xinaré (onde paramos para um delicioso banho na prainha), Tapera de Itiúba e Barra de Itiúba. Foi um dia de pedal tranquilo e sem intercorrências, exceto, pela surpresa da decisão de não seguir conosco do nosso querido Max, atual presidente do Grupo Zuandeiros, e companheiro ímpar de outras aventuras. Alegou cansaço e retornou para Aracaju.
A cidade original do roteiro é Porto Real do Colégio (AL), mas, nossa opção, pela segunda vez, de nos hospedarmos em Propriá decorreu da melhor infraestrutura de acomodação e alimentação disponível nessa cidade. Ficamos na Pousada Katty (R$ 60,00 / pessoa), localizada na BR 101, na cabeceira da ponte que liga os Estados de Sergipe e Alagoas. Chegando cedo vale a pena uma visita ao centro de Propriá, uma das principais cidades de Sergipe.
Em relação à viagem anterior, decidimos inovar no trecho Propriá (SE) – Traipu (AL). Em vez de irmos pelo estradão de São Brás até Traipu, fomos por uma trilha que margeia o Rio São Francisco. Depois de apreciarmos os belos cenários nas margens do Velho e, agora, agonizante Chico e de um dia emocionante por trilhas desafiadoras, com direito a travessia de um pequeno braço do Rio, passando pelos Povoados Lagoa Comprida, Bom Jardim, dentre outros, tivemos que suspender o pedal no Povoado Sítio do Bode (39 km). Motivo: ainda não sabemos o que houve, mas pegamos uma trilha sem saída. Resumindo: nos perdemos. Tivemos que retornar cerca de 2 km do ponto sem saída até o Povoado Sítio do Bode, onde negociamos a locação de duas canoas para darmos continuidade a viagem.
Singramos “Chico” acima por cerca de 4 km, quando desembarcamos e retornamos para a estrada. No total foram 47 km de bike mais 4 km navegando, com vários pneus furados e muita aventura para um só dia. Em Traipu descansamos na aconchegante Pousada Minha Casa, Sua Casa (R$ 60,00 / pessoa)
O penúltimo dia de pedal foi entre as cidades de Traipu e Pão de Açúcar, num total de 71 km. Este trecho é o que exigiu maior preparo físico, em face da sequência de subidas, dos vários tipos de terreno, sempre bem acompanhados, durante todo o dia de muito…muito…muito calor. Todo esse desafio foi compensado pelos lindos visuais do trajeto entre Belo Monte e Pão de Açúcar.
Como atrasamos na saída de Traipu (9h30) e no Povoado Riacho da Jacobina não havia nada em se tratando de alimentação, quando chegamos na pequena e bucólica cidade de Belo Monte (47 km) não encontramos almoço. Fomos salvos por uma lanchonete. Depois de quatro pneus furados, um pedal totalmente danificado e a quebra da mesma corrente duas vezes, chegamos, à noite, em Pão de Açúcar (por isso é sempre aconselhável viajar com kit de iluminação).
No último dia relaxamos um pouco mais e saímos às 10h30 para percorrermos os 60 km finais. Neste trajeto juntou-se ao grupo mais uma representante do time feminino: a doce Ana Cândida, noiva de nosso inestimável companheiro de viagem Gilton Melo.
Intenso calor e encantos, casamento de clima e paisagem muito característico do sertão nordestino. Chama a atenção neste trecho a acentuada e relativamente longa subida no km 8,5. Sem sombra de dúvida, a mais destacada de todo o percurso.
Almoçamos no Povoado de Entremontes, famoso pela confecção de rendas e bordados, o qual nos recebeu com um acentuado declive na chegada, nos presenteando com um dos mais belos cartões postais do roteiro. Do outro lado do rio, em terras sergipanas, fica a Grota de Angico, onde em 28 de julho de 1938, o lendário Lampião, Maria Bonita e outros cangaceiros foram mortos pela volante comandada pelo Tenente João Bezerra. Após um refrescante banho antes e pós almoço partimos em direção a Piranhas.
Piranhas é uma cidade histórica, localizada na margem esquerda do São Francisco, Alagoas, muito bela, bem cuidada e rica em atrativos turísticos (Museu do Cangaço, Museu de Arqueologia de Xingó, Grota de Angico, Cânion do Rio São Francisco etc). Oferece também muitas opções de bares e restaurantes, por isso, merece, no mínimo, duas noites para ser, minimamente, degustada.
Depois de cinco dias, 371 km de pedal e muita história para contar foi o que fizemos no final de semana.
Texto e fotos: Sebastião Filho / Aracaju (SE)
Mapeamento: Wikiloc (Caminho do Imperador AL / Por SF – AJU)
Mais fotos: https://www.oszuandeiros.com