Cicloturismo: Travessia Paraná Leste-Oeste (731km)

Por José Sérgio Franco

Sempre fui apaixonado pelo ciclismo, especialmente o mountain bike. Desde a adolescência em Guaíra (onde nasci e residi até o ano de 2003), pedalava todos os dias a distância de 50 km. Tínhamos uma turma animada e que levava muito a sério esse esporte. Em 1992, meu cunhado Rogério e o tio dele Sr. Manoel, resolveram fazer uma viagem de bike entre Guaíra e Curitiba.

Em apenas três dias estavam chegando á capital do Estado. Foi de fato um atrevimento, afinal apenas no primeiro dia pedalaram 280 km debaixo de chuva até Maringá. Quando retornaram á Guaíra, muitos foram os relatos das estórias ocorridas durante a viagem. Eu com meus 13 anos de idade fiquei encantado com os acontecimentos daquela aventura.

A vontade de um dia viver algo parecido marcou em mim. No entanto, a vida toma outros rumos e por muitos anos deixei a magrela encostada. Porém, o que nunca deixou de existir foi a paixão pelo esporte.

Em 2009 já residindo em São José dos Pinhais, voltei a pedalar o que despertou em mim novamente toda a vontade de fazer uma viagem de bicicleta, ainda maios lendo blogs de cicloturismo como o de Nelson Neto (cicloturismo selvagem). Em 2011 iniciei os preparativos, porém por motivos alheios á minha vontade, fui obrigado a desistir antes mesmo de começar os treinos preparatórios.

Já em Abril de 2012 com a intenção de uma vez por todas fazer a tão sonhada viagem, convidei o Pedro, um amigo de pedal. Para minha surpresa, ele não pestanejou para responder que topava participar da empreitada. Decidimos fazer a viagem no começo do mês de julho, época de férias.

Pedro estava otimamente condicionado. Eu nem tanto, pois fiquei até o final do mês de março de 2012 praticamente sem treinar, em razão de uma lesão ocorrida em dezembro de 2011 (quando estava em ótima forma). Nesse período, por ter enfiado o pé na jaca no quesito alimentação, também ganhei peso.

Eu tinha os meses de abril, maio e junho para me preparar. Assim, retornei para a musculação e meus pedais passaram a visar mais a ganhar resistência para longa distância e eliminar peso do que necessariamente ganhar velocidade. Tinha que eliminar pelo menos seis quilos até a viagem.

Além da musculação, pedaladas e cuidados com alimentação, eu também coloquei na minha planilha alguns dias dedicados à corrida a pé. Semana por semana eu percebia o resultado, tanto na questão de ganho de resistência quanto na eliminação de peso. Também incluí na rotina de treino um pedal longo, entre 100 e 120 km todos os sábados, tenho certeza que isso colaborou bastante.

Fixamos como data para a partida o dia 01 de julho de 2012 e quanto mais essa data se aproximava, nós tínhamos que acelerar na organização de detalhes como roteiro, decidir o que levar durante a viagem, comprar bagageiro etc.O mês de abril já havia se esgotado e mais um corajoso topou fazer parte da equipe, o grande parceiro de sempre Waldemar. Porém, ele iria se desgarrar do grupo quando chegássemos em Cascavel, já no quarto dia. De lá ele partiria para Foz do Iguaçu, com um trecho de 145 km. Eu e Pedro iríamos para Guaíra (que também faz fronteira com o Paraguai), a 150 km de Cascavel. Ou seja, curiosamente iríamos percorrer praticamente a mesma distância.

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – O Roteiro

Planejamos o trajeto para cinco dias, através da rodovia BR 277 com a seguinte ordem:
1º dia: São José dos Pinhais até Irati: 170 km
2º dia: Irati até Guarapuava: 112 km
3º dia: Guarapuava até Laranjeiras do Sul: 110 km
4º dia: Laranjeiras do Sul até Cascavel: 150 km
5º dia: Cascavel até Guaíra: 150 km

Eu particularmente decidi levar apenas duas mudas de roupa para usar no hotel e outras sobressalentes para pedalar. Também uma jaqueta impermeável para o caso de chuva. Fora isso, levamos itens como kit reparo, câmara de ar, remédios para dor de cabeça, lanternas na bike, manchão, protetor solar, escova dental, bandana, carregador de celular dentre outras quinquilharias necessárias que no total deram praticamente 7 quilos de bagagem. Já fiz inúmeros pedais com até 130 km, porém nunca uma viagem onde longas distâncias teriam que ser pedaladas por dias seguidos, no caso, por cinco dias. Não há como negar que isso gera certa ansiedade.

Quando comentávamos com as pessoas sobre nossa odisseia, ouvíamos: “vocês estão loucos, sem juízo”. Outros já incentivavam e diziam achar a legal. Não importa a reprovação das pessoas, você deve seguir o seu coração e o meu sempre desejou sentir o gosto da liberdade e do desafio que é uma viagem como essa.

Quando faltavam exatos 14 dias para o dia determinado para a nossa saída, fiquei muito apreensivo, pois em um dos treinos senti uma dor no joelho esquerdo, justo o que me deixou parado por quase três meses no começo do ano. Não poderia acreditar que o projeto de meses iria ser abortado por conta de uma lesão.

Decidi então não pedalar nestes últimos 14 dias, para evitar qualquer complicação. No dia 30 de maio, ou seja, um dia antes da viagem, pedalei alguns poucos quilômetros e não senti nenhuma dor, porém, confesso que estava com muito medo de ter que desistir no meio do trajeto por conta da tal dor aparecer.

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – 1º DIA

Mas o grande dia chegou e partir era preciso. Exatamente ás 05h30minh da manhã, dei um beijo e um abraço em minha esposa e junto com os demais partimos rumo ao nosso objetivo.
Posto agora, algumas frases que representam muito aquele momento de despedida e partida:

‎”Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.” Fernando Pessoa.

O ser humano precisa ter uma experiência autentica na sua vida. Amyr Klink.
Um dia é preciso parar de sonhar e, de algum modo, partir.
Amyr Klink

Confesso que no momento da partida fiquei muito emocionado, pois como diz o navegador Amyr Klink: O maior medo do navegador é o de nunca partir. E eu estava partindo, na intenção de que tudo desse certo e dias depois estivesse junto novamente de minha família e amigos.

Porém, eu tinha certeza que cinco dias depois, aquele já seria outro, transformado pelas experiências que uma aventura como essas podem proporcionar em todos os sentidos. Saímos exatamente ás 05h30min de minha casa no centro de São José dos Pinhais, com a total animação do trio. Logo estávamos no contorno de Curitiba e com 20 km de pedalada, o primeiro pneu furado, na bike do Pedro. O que aliviou um pouco é que paramos num posto de gasolina. Demoramos em torno de 30 minutos nesta troca e seguimos viagem.

Ao começarmos a subir a serra de São Luiz do Purunã, já estava dia. Paramos no pedágio para tomar um café, alguns speedeiros que lá estavam ficaram curiosos sobre nossa viagem, um pessoal bom de papo. Quando fomos sair para continuar, mais um pneu furado, desta vez do Waldemar e dele manutenção, porém após a troca percebemos que a nova câmera de ar havia sido danificada quando da troca. Putz grilo! Fazer o que, mãos a obra novamente. Com apenas 60 km percorridos, já tínhamos três pneus furados.

Após termos percorrido praticamente 100 km, o Rodolfo irmão do Waldemar nos alcançou de carro e fez algumas imagens. Batemos um papo, mas nossa empreitada deveria continuar e nos despedimos. Valeu Rodolfo pelo apoio. Era em torno de 13 horas, quando paramos numa lanchonete que fica próxima à cidade de Palmeira, onde fizemos um lanche. E como estava bom aquele lanche! Serviu de almoço e também aproveitamos para recarregar a bateria da lanterna. A sensação de estar na estrada, em direção ao nosso destino, era muito boa.

Já havíamos pedalado 170 km, estava noite e nada de chegar a Irati, nosso destino neste primeiro dia. Sem contar que os últimos 40 km eram de subidas intermináveis e com descidas leves. Mas logo avistamos a entrada da cidade, uma avenida sem fim para quem já estava há horas na estrada. Era hora de procurar um hotel e nada melhor do que perguntar para algum transeunte. Perguntei para um senhor que caminhava pela calçada e para nossa surpresa ele se ofereceu para nos guiar de carro até um hotel. Registro aqui o nosso agradecimento ao Sr. Adalberto, pois foi uma mão na roda!

Hotel bom para o nosso propósito e preço interessante (R$45,00). Nesta primeira noite decidimos pegar um quarto triplo. Levamos as bikes para o quarto e após um banhão nos acabamos de comer em um rodízio de pizza. De volta ao hotel fomos dormir. Neste primeiro dia, não haviam dores musculares e nem a bunda estava a incomodar tanto, apenas o cansaço natural de termos percorrido 186 km no total e por isso Imaginamos que iríamos desmaiar para dormir, ledo engano. Waldemar começou a roncar. Como disse o Pedro, era na ida e na volta. Um verdadeiro trator rs.

Ainda no meio da noite, fui á recepção do hotel para verificar se havia outro quarto, porém a recepção estava sem ninguém. O jeito foi voltar ao quarto e encarar mais esse desafio rs. Só consegui dormir depois das 3 horas da manhã, quando ele relaxou e parou com aquele ronco desesperador. Uma lição: quarto triplo NÃO MAIS rs.
Concluir esse primeiro dia foi excelente, afinal no quesito distância este era o dia mais desafiador. Estávamos felizes!

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – 2º DIA

O segundo dia nos reservava 112 km entre Irati e Guarapuava, porém iríamos enfrentar a Serra da Boa Esperança com 10 km de extensão. Acordamos por volta de 7 horas e fomos tomar o café oferecido pelo hotel. Antes de pegar a rodovia 277 paramos para registrar a Santa de Irati, que rendeu uma bela imagem em meio à neblina.

Ainda dentro da cidade, numa subida extremamente íngreme o power link da corrente de minha bike abriu, dando um susto, porém foi resolvido rápido. Waldemar percebeu que eu estava chateado com aquela situação logo no primeiro km de pedal daquele dia e resolveu fazer um vídeo e para completar, ainda ficou cornetando pelo fato de eu ter dito que até aquele momento minha bike não tinha furado nenhum pneu. Faz parte rs.

O dia estava lindo, com céu aberto sem qualquer nuvem, exatamente como no dia anterior. Na estrada paramos em um chalé, onde é vendido vários tipos de doces. Muito bom, afinal uma glicose era muito bem vinda, além de o lugar ser extremamente simpático. Depois de alguns quilômetros pedalados, a bunda começou a dar sinais de cansaço e de possível assadura. Chegamos ao pedágio e pausa para um café. Aproveitamos para passar pomada, assim poderíamos prevenir assaduras. Neste pedágio havia uma poltrona onde sentei para descansar e olhe que foi difícil levantar daquela maravilhosa e macia poltrona.

Depois de uns 20 minutos de descanso, decidimos partir e adivinhe: o pneu da bike do Waldemar simplesmente explodiu com a bike ainda parada. Não adianta lamentar, o negócio é meter a mão na roda. Era o quarto pneu furado. Reparo feito, partimos em direção a subida da Serra da Boa Esperança, com seus 10 km de extensão e inclinação parecida com a da Serra do Mar entre Curitiba e o litoral. Nesse trecho, destaque para o visual do Morro do Chapéu, que rendeu boas fotos.

Com muita paciência vencemos a serra, sempre com Pedro á frente. Apesar de o dia ter apenas 112 km, o final foi cansativo. Guarapuava não chegava, mas ainda assim, ainda era dia quando chegamos. Waldemar se informou sobre um hotel a beira da BR277. Foi o melhor hotel (HOTEL SOLEDADE) e surpreendentemente o mais barato (R$32,00 com direito a TV).
Neste dia, numa tentativa de afugentar as dores que começavam a aparecer, certas frases viravam bordões como: “aqui o sistema é bruto”, ou “ai minha bundaaaa” e “se fosse fácil não teria graça”…rs. E ainda o bordão do Pedro: “uhhh maravilha!!!”. De fato, o bom humor e companheirismo foram pontos fortes de nossa viagem.

Dessa vez optamos por quartos individuais rs. Jantamos num restaurante ao lado do hotel. De volta ao quarto do hotel, até tentei assistir uma tela, mas desmaiei de sono. No outro dia, Pedro nos contou um fato curioso que ocorreu com ele durante aquela madrugada. Havíamos combinado de nos encontrar no café da manhã ás 6 horas. Disse ele que acordou e por uma fresta da cortina percebeu que já havia amanhecido e levantou assustado, afinal estaria atrasado. Arrumou seus apetrechos o que demora um pouco, preparou a bike e vestiu a roupa de ciclismo e inclusive passou protetor solar. Quando já estava a sair do quarto com a bike, olhou no computador de bordo e percebeu que eram ainda 3 horas da manhã! Putz! Olhou pela janela e percebeu que a claridade vista por ele na tal fresta, era por conta de luzes do estacionamento do hotel e não do amanhecer. Segundo ele, caiu na risada sozinho num quarto de hotel, as 3 da madruga. O jeito foi voltar a dormir.

Neste dia (segundo dia) o DESAFIO PARANÁ LESTE-OESTE completava 300 km percorridos e estávamos muito felizes.

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – 3º DIA

O dia amanheceu e estava lindo mais uma vez. Arrumei as coisas e desci para tomar o café da manhã com Pedro e Waldemar. Não tem coisa melhor do que encontrar seus parceiros no ouro dia pela manhã e a primeira coisa que se vê é um baita sorriso e plena animação para mais um dia, assim foram todos os dias.

O percurso seria entre Guarapuava e Laranjeiras do Sul, num total de 110 quilômetros. Ao subir na bike, as dores musculares, bem como a dor na bunda era um fato, para todos. Mas com alguns quilômetros percorridos, elas eram amenizadas pelo aquecimento do corpo.

Esse foi um dia muito interessante por dois motivos: um que estaríamos vencendo mais da metade do desafio e outro pelo fato de que apesar de ainda estarmos há mais de 400 km do final da aventura, pela primeira vez avistamos uma placa que indicava em conjunto os dois destinos da equipe (Pedro e eu rumo á Guaíra e Waldemar rumo a Foz do Iguaçu), bem como indicava ainda a cidade onde teríamos que nos separar no último dia (Cascavel). De fato a emoção tomou conta de todos e fizemos um belo registro daquele momento.

Os primeiros 60 quilômetros do trajeto deste dia foram de imensas retas e com subidas longas, porém leves. Mas não foi só molezinha, o restante até chegar a Laranjeiras do Sul, foi de subidas bem fortes. Descobri que meus parceiros eram viciados em laranja. Acho que apenas neste dia paramos nuns cinco pés destas frutas. No final das contas, até eu que não sou fã dessa fruta in natura, me rendi a umas laranjas. Pedro chegou a fazer suco rss. Ah sim, a galera atacou também um pé de suculentas ameixas.

A única ponte em arco de todo o trajeto, no rio Cavernoso é uma obra muito bonita e não poderíamos deixar de registrá-la. Eventualmente quando queríamos nos refrescar, o que não faltavam eram pequenas quedas de água ou ainda minas a beira da rodovia. Ah que alivio! Apesar de em alguns momentos nos distanciarmos uns dos outros, estávamos sempre no visual, afinal éramos uma equipe. Sempre depois de uma subida forte nos reagrupávamos e seguíamos todos juntos novamente, o nosso destino.

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) -
Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – Foto: acervo pessoal José Sérgio Franco

Em Virmond eu e Waldemar paramos em uma lanchonete a beira da rodovia para comprarmos um isotônico, estava fazendo falta. Em dado momento ouvi um estalo, depois parei e verifiquei. Quebrou um raio da roda traseira.

Ao chegarmos a Laranjeiras do Sul, tiramos uma foto com um imenso trator movido a vapor, muito interessante que fica na entrada da cidade. Ficamos no hotel Lipinski ao custo de R$45,00, valor caro pelo estilo de acomodação. Jantamos em um restaurante ao lado do hotel, após eu e Pedro fomos ao banco, pois la plata havia acabado. Como eu havia levado minha bolsa de gel, nessa noite fiz um gelo em meu joelho que estava um pouco dolorido. Neste dia ainda o Marcelo Catarina entrou em contato via fone, bem no momento que antecedia nosso jantar. Valeu Marcelo, pelo apoio!

Completamos 415 km percorridos. Estávamos extremamente felizes.

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – 4º DIA

Nem é preciso dizer sobre o cansaço acumulado por percorrer esses 415 km em dias seguidos, contudo pedalar era preciso e depois do café da manhã, saímos em torno de 07h30minh da manhã. Quando ainda estávamos na cidade, veio nos cumprimentar, o Thiago, proprietário da Lodi – Casa do Ciclista de Laranjeiras do Sul. Tiago nos passou o telefone da loja e disse que se fosse necessário algum socorro, bastaria ligar. Valeu Thiago!

Tínhamos pela frente 150 km entre Laranjeiras do Sul e Cascavel, incluindo a pedalada até o hotel. Segundo relatos de pessoa da região, o começo do trecho (em torno de 70 km) seria de muitas subidas fortes e que após uma longa descida (8 km) o segundo trecho seria mais fácil com longas retas. Dito e feito.

O quarto dia nos reservou também lindas paisagens. Passamos ainda pelo aldeamento indígena, onde fiz um registro de algumas crianças. A rotina de caça á laranjas continuou rs. Pedro pegou trauma daquelas placas indicando começo da terceira pista, afinal isso indicava que viria uma subida forte.

Antes um pouco de Ibema, paramos no pedágio para um descanso, tomar um café e alongamentos. Após as intensas subidas por mais de 70 km, de fato as retas próximas a Cascavel apareceram, porém pedalamos por mais de 30 km com um vento contra, extremamente forte. Aquilo castigou bastante, pois a pedalada além de ser desgastante, não rendia e Cascavel não chegava.

Mas o trevo cataratas era uma realidade, bem como o intenso movimento de Cascavel. Nem imaginávamos que nossa aventura naquele dia estava longe do fim. Como havia uma feira na cidade, vários hotéis que procuramos estavam lotados, depois de rodar dentro da cidade por praticamente uma hora, já durante á noite, nos foi indicado uma pensão. E lá fomos nós. O local não era lá aquelas coisas (“pulgueiro”), mas como estávamos exaustos, resolvemos ficar ali mesmo.

Banho tomado, fomos num rodízio de pizza. Hum e como estava bom! Pizzaria Piratas vale a pena se você for em Cascavel, ambiente temático e agradabilíssimo. A caminhada de volta da para o pulgueiro digo, pensão, foi complicada, as dores musculares estavam extremamente fortes, para subir escada então rs, era um Deus nos acuda.

Eu e Pedro ficamos em quarto duplo, pois não havia outros quartos individuais, apenas um que deixamos para o Waldemar (por que será? kkk) Como fiquei na parte de cima do beliche sem escada, subir nela era outra odisseia por conta das dores nas pernas. Não gemer era impossível.

Nessa noite o cansaço era tanto, que troquei as pomadas. Ao invés de passar a pomada para assaduras, passei a pomada de diclofenaco. Percebi algo diferente. Tive que tomar banho e passar a pomada correta. Pedalamos neste dia 150 km.
Assim completamos o acumulado de 565 km e não havia furado nenhum pneu de minha bike. Eita amarelinha velha de guerra!
Estávamos completamente felizes!

Travessia Paraná Leste-Oeste (731km) – 5º E ÙLTIMO DIA

Exatamente ás 6h da manhã meu celular tocou o despertador, era hora de levantar para enfrentar o último dia. Acordei o Pedro e também dei uma batida na porta do quarto do Waldemar. Não podíamos nos atrasar neste dia, afinal tínhamos pelo menos 150 km pela frente.

Infelizmente o pulgueiro, onde ficamos não servia café da manhã e tivemos que ir a uma panificadora, ainda estava escuro. Após nos alimentarmos bem, seguimos em frente pelas ruas de Cascavel até o trevo cataratas, na saída da cidade.

Lá paramos e fizemos um vídeo com um breve relato, afinal ali infelizmente o trio que dividiram tantas emoções nesses últimos quatro dias, iria em parte se separar. O grande amigo Waldemar iria com destino a Foz do Iguaçu. Eu e Pedro iríamos para Guaíra. Então nos despedimos e combinamos de manter contato durante o trajeto final.

A rodovia entre Cascavel e Toledo é duplicada e sem muitas subidas, muito boa para desenvolver certo ritmo, porém o vento contra, logo deu as caras o que causou muito desgaste. O pior é que ele apenas parou quando estávamos muito próximos á Guaíra.
Após termos percorrido algo em torno de 20 km, Pedro percebeu o pneu traseiro furado. E foi uma trabalheira danada, que nos consumiu uns 30 minutos. Manutenção feita, tocamos em frente e Cascavel ficou para trás.

Com exceção do vento contra, tudo transcorreu bem até Toledo onde entramos na cidade para pegarmos a rodovia que nos levaria até Marechal C. Rondon. Aproveitei para fazer uma ligação referente ao trabalho. A ciclovia de Toledo e bikes a disposição para aluguel me chamou a atenção. Parabéns para a cidade!

Já o trecho entre Toledo e Marechal Candido Rondon é com acostamento muito ruim e trânsito intenso de caminhões, o que deixou a pedalada bem estressante. A fome bateu forte, principalmente no Pedro e a vontade de chegar logo em M. Rondon só aumentava. Quando faltavam 10 km para chegar em Marechal recebemos um mensagem do Waldemar, ele já estava em Medianeira.

Ufa! Mais algumas pedaladas e chegamos a Marechal Cândido Rondon, cidade de colonização alemã. Procuramos um lugar para almoçarmos, mas pelo horário (após 13h) encontramos dificuldade e conseguimos um PF num simples restaurante. Aquele almoço foi como jogar água numa planta desidratada. Restabeleceu todas as energias. Ficamos um pouco em uma praça no centro da cidade para digestão e observei como os rondonenses utilizam a bike no seu cotidiano. Pessoas de todos os perfis. Acho que todo rondonense ganha uma bike quando nasce, faz parte da cultura da cidade. A prefeitura faz sua parte com a implantação de ciclovias. Como diz o Pedro: que maravilha!

Depois de um breve descanso, partimos rumo á última cidade do desafio, Guaíra distante 65 km. Este trecho está com obras na rodovia, além do que em alguns quilômetros não há acostamento o que atrapalha em muito a viagem. O vento, ah este ainda era o terceiro elemento, assumiu o lugar do Waldemar.

Em determinado momento, Pedro foi obrigado a sair para o acostamento ruim e para não perder a prática, teve seu pneu furado, após controlar a bike em meio aos buracos.

Logo chegamos ao rio Guaçu, onde para minha surpresa e alegria nos encontramos com meu cunhado Rogério (biker) que veio nos encontrar. Faltavam apenas 35 km. Passamos por mais um trecho (3 km) em obras na rodovia que exigiu bastante atenção de nossa parte, porém os últimos 20 km foram de rodovia com acostamento perfeito. Já era noite quando avistamos no horizonte, as luzes da cidade. Avisei ao Pedro que tínhamos apenas uma subida para vencer e estaríamos em Guaíra.

Em todos esses dias de pedaladas, meu joelho teve altos e baixos no quesito dor, porém ao final praticamente sem dor. Agradeço muito a Deus por isso.

Após uma rotatória enfim o centro da cidade, havíamos concluído nossa aventura, a emoção tomou conta, o sorriso e comemoração eram constantes, fiz um breve vídeo para registrar aquele momento único.

Até ali foram 730 km em 36 horas pedaladas em cinco dias. Paramos para um registro fotográfico e para fazer uma ligação para o amigo Waldemar. Este já estava em Foz do Iguaçu, feliz da vida com 737 km percorridos. Depois de percorrer mais alguns quilômetros chegamos á casa de minha mãe, fechando aí 731 km, onde o resto da família nos aguardava. Desafio 100% concluído!.

Estávamos em estado de êxtase!
WALDEMAR PLANETA EXTREMO

Grande Waldemar, que em Foz estava um tanto quanto ocioso, sem nada pra fazer, então o cara resolveu participar da Meia Maratona de Foz do Iguaçu, apenas três dias depois de ter percorrido os 737 km de bike até Foz. E fez bonito, concluiu os mais de 21 km de corrida a pé em 2h28min. Parabéns Waldemar.

IMPRESSÕES

Por mais que eu tente descrever em palavras, fotos, vídeos ou por mais que eu fale, eu jamais conseguirei expressar exatamente como é emocionante fazer uma viagem como essas.

Eu, Pedro e Waldemar, nos transformamos em irmãos nestes dias que passamos juntos, mais exatamente em três crianças livres, com seus brinquedos tendo a rodovia como nosso parque de diversões.

É ótima a sensação de estar conquistando cada quilometro, de ver as pessoas nos cumprimentando por onde passávamos e motoristas dando buzinadas de incentivo. Em Cascavel, por exemplo, um transeunte de longe bradou: E aí cicloturistas! Com muita satisfação, acenamos.

Sim, pedalar com bagagem é um informativo sobre o perfil do ciclista. Percebemos bem essa diferença, até pelo respeito com que sempre fomos tratados pelos motoristas, seja na rodovia ou dentro das cidades.

Outro ponto interessante neste tipo de aventura é o contato com as pessoas, que sempre ficam curiosas. De onde será que esses três estão vindo e para onde irão? Assim, a bike abre oportunidades de conhecer e conversar com as pessoas. Não foram poucos que não aguentaram a curiosidade e quiseram saber sobre a aventura. Surpreendem-se sempre.

Não me esqueço da frase dita pelo Danilo, um gente boa, dono de uma borracharia próximo á Laranjeiras do Sul, quando soube detalhes da aventura: “Vocês tem barulho de carroça na cabeça!” O que nos fez dar boas risadas. Também me lembro de um motorista das Casas Bahia que nos encontrou num pedágio próximo a Cascavel e em conversa disse ter nos visto ainda em Curitiba e estava entusiasmando pela distância que já havíamos percorrido.

Contemplar a natureza é outro ponto forte, a cada momento um visual diferente. Uma montanha diferente como o morro do chapéu, uma queda d’água e ao chegar a Cascavel, a terra de cor vermelha era evidente. Quando passamos de carro não temos como perceber os detalhes, de bike tudo tem outra dimensão.

Recordo-me ainda de um senhorzinho que se mostrou todo preocupado com a nossa segurança, nos aconselhou sobre como atravessar a ponte em arcos, sobre o rio cavernoso. Depois o vimos vencendo, pedalada por pedalada uma imensa subida, sobre sua bike simples, estilo barra forte.

Após pedalar por 731 km divididos em cinco dias, a chegada durante á noite em Guaíra, minha cidade natal foi emocionante, contagiante, estávamos realizados. Não há palavras. Um filme passou pela minha mente, com lembranças desde a ideia de fazer tal desafio, os treinos, preparação e realização.

Já não somos os mesmos de cinco dias antes, agora estávamos transformados pela nova experiência, pelo desafio pessoal concluído, do aprendizado sobre aspecto físico e psicológico de nossos corpos, além da experiência adquirida sobre a pedalada de longas distâncias em rodovia, sem carro de apoio.

AGRADECIMENTOS

Agradeço ao Junior da Bike Shop, que me cedeu uma roda traseira de bike, pois uma peça de manutenção da roda original de minha bike não chegou a tempo. Valeu Junior.

Agradeço á minha esposa, pelo apoio á minha participação no desafio. Esse apoio é fundamental!

Agradeço aos meus amigos Pedro e Waldemar, por terem topado me acompanhar e pelo companheirismo durante toda a viagem.

Agradeço a Deus por ter guiados nossos passos.

Agradeço ainda á todos àqueles que durante o trajeto nos ajudaram de alguma forma.

NÚMEROS CURIOSOS

Em cinco dias foram:

  • 22.000 calorias gastas durante as pedaladas
  • 36 horas pedaladas
  • 7 pneus furados (3 Pedro e 4 Waldemar)
  • Em torno de R$350,00 com hotéis, jantar, almoço e outros.
  • 731 km pedalados (Pedro e Sérgio)
  • 737 km pedalados (Waldemar)
  • Média total (computador zerado em São J. dos Pinhais e verificado apenas em Guaíra): 20 km/h.
  • 6 kg foi o peso médio de bagagem da cada um.

VÍDEOS

Dicas de Hospedagem

Você pode reservar hotéis, pousadas, hostels e até casas de hóspedes através do Booking.com. Assim terá muitas opções para comparar e escolher a que vai te atender da melhor forma.

Cicloturismo Vale Europeu: “Forever Alone” com Neve

Por Caroline de Barba

Resolvi fazer o Circuito Vale Europeu de Cicloturismo (SC) em julho de 2013. Não achei vivente disponível para me acompanhar na data. Então, tive que percorrê-lo sozinha. Tudo bem, já que moro nessa região e conheço todo o trajeto. Meu plano era percorrer os 300km em 4 dias.

Uma chuva torrencial me fez perder o primeiro dia de viagem e encurtar uns 30 km do percurso inicial. No dia seguinte, saí num frio tenebroso, num céu apocalíptico com a missão de fazer dois trechos da programação inicial. Desinformada dos acontecimentos da madrugada parti “empacotadamente” feliz.

Na segunda cidade do roteiro (Rodeio), parei para almoçar e descobri que havia nevado na região. “Sabe de nada, inocente!”, pensei. Mesmo com as previsões sinistras de geada negra anunciadas exaustivamente durante a semana, saí de casa sem ligar TV, rádio ou internet… Nem as coisas brancas estranhas nas montanhas de Indaial me fizeram desconfiar. Uma mulher, mais desinformada que eu, falou que era geada.

Fiquei com medo, mas segui caminho, nem que fosse para ver a neve e voltar para casa. E como tinha neve ainda (apesar do sol)! Tudo tão branco, tão diferente! Resolvi seguir com o plano da viagem. Tive mais sorte que juízo.

Foto: acervo pessoal Caroline de Barba
Foto: acervo pessoal Caroline de Barba

No dia seguinte acordei com muita geada e muito frio. Logo cheguei ao primeiro riacho do caminho. Estava muito cheio e a água devia estar geladíssima (meu garmin marcava 3 º C). Eu já estava começando o tirar a botinha e sacrificar meus pezinhos para atravessá-lo. Quando, milagrosamente, naquele lugar inóspito, apareceu um motoqueiro de bota de borracha. O camarada gentilmente atravessou minha bike pelo rio e depois me atravessou montada na moto. Deus abençoe esse cidadão!

Mas havia mais perrengues me aguardando. A neve havia derrubado muitas árvores (e entortado outro tanto). Em alguns trechos a estrada estava fechada e tive que me arrastar por baixo delas, puxando a bicicleta. Foi um dos momentos mais tensos que já vivi com a magrela.

Ainda havia muita neve e a paisagem compensava. Nesse dia, além de frio, também passei fome. Contava com uma paradinha num hotel no meio do percurso da tarde. Mas ele estava fechado e só fui achar um boteco perto do local de pernoite. O dono teve ter se assustado com a troglodita devorando salgadinhos e bolachas enquanto falava de boca cheia.

Já havia passado por neve, geada e para fechar com chave de ouro, choveu no último dia. A estrada estava uma lama só. Com duas pedaladas eu já estava imunda! Não resisti e cortei caminho. Esse é um dos problemas de conhecer bem a região: você sabe exatamente como trapacear…

Cheguei em casa mais cedo, encharcada, moída e feliz. Cheia de aventuras para contar e roupas sujas para lavar!

Essa e outras histórias estão no livro “Cicloviagens 2013”. Disponível em: https://clubedeautores.com.br/book/175067–Cicloviagens_213#.VFPONuktCHs

[Nota do blog:] se você vai pedalar pelo Circuito de Cicloturismo Vale Europeu, pode consultar campings, pousadas e hoteis nos links abaixo:

Cicloviagens e provas de longa distância: uma paixão descoberta aos 40 anos

Por Patricia Barcellos

Minha paixão pela bicicleta começou tarde. Sou gaúcha, mas moro em Florianópolis desde 1995. Em 1999, quando tive a primeira filha, após a separação, comprei uma bicicleta, que seria meu meio de transporte. Com ela ia trabalhar, fazer compras, visitar os amigos e até ir à praia. Colocava tudo nela. A cadeira de bebê, um balde com brinquedos, guarda-sol preso no quadro. E na mochila, cheia de coisas de bebê, ainda amarrava a cadeira. E assim, ia, feliz da vida curtir a Praia de Moçambique, que ficava há 03 km de onde eu morava.

Anos depois, mudei de bairro, e já com duas filhas, trabalhando em um hotel em frente de casa, usava pouco a bicicleta. Acabei vendendo. Minha energia ligada ao mar me levou a fazer cursos de mergulho e era o que preenchia meus dias de folga. Ir para o mar, passar os dias mergulhando.  Conheci muitos mergulhadores e o pessoal das escolas de mergulho. Sempre saia com o barco que ficava perto de casa, mas pra variar, resolvi conhecer outros picos de mergulho, e uma das escolas ficava a 25 km de casa. Sem carro e sem horários de ônibus compatíveis com o horário de saída do barco, resolvi pensar em encarar a distância de bicicleta, em prol dos meus mergulhos.

Comprei a bicicleta do vizinho que estava jogada num canto da garagem. Bicicleta de ferro, meio enferrujada, tinha que fazer alguma manutenção, trocar algumas peças. Ficou boa pra uso. Então era só isso, pegar todo o equipamento de mergulho, jogar nas costas, amarrar na bike e encarar algumas subidas e descidas do percurso. E eu já feliz da vida encarando 50 km toda vez que ia mergulhar.

Daí comecei a observar (como eu tinha que sair muito cedo) o sol nascer de outra perspectiva, o trajeto com outro olhar. E ao invés de só ir para a base de mergulho, eu também olhava pro lado, pra cima, para o caminho. E no percurso tem uma reserva florestal e eu ia sentindo o ar gostoso da manhã, e quando voltava do mergulho, toda zen com o pensamento no fundo mar, curtindo as belezas da ilha, pedalando.

Em 2010 conheci meu atual marido. Ele, carioca, triatleta, fazia três anos estava morando na ilha. Viu minha bike e falou: “nossa, como você consegue carregar todo esse peso, numa bike que pode até causar tétano!”  Eu não entendia nada de bike…

Então, investi numa nova bicicleta. Capacete, sapatilha e ferramentas para troca de pneu. Ele me ensinou a trocar pneu, consertar câmara, limpar a bike. E começamos a passear juntos. Eu, cada vez pedalando distâncias maiores e me sentindo cada vez mais confortável.

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Liberdade é a primeira palavra que me vem à mente para definir o que é pedalar.

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Seis meses depois, em agosto de 2011, viagem planejada. De carro, com as bikes no suporte, fomos acampar em Cumuruxatiba – BA. Percorremos toda a região de Prado com as bicicletas. Mar, praias, falésias, fazendas, estradas de chão e asfalto sem fim, coqueirais. Giramos aproximadamente 250 km naqueles 10 dias, coisa que eu jamais supunha fazer. Retornando pra casa, de carro pela BR 101 e empolgados com a nossa aventura, vínhamos planejando o que seria nossas férias do ano seguinte: ir de Florianópolis até Niterói, de bike, claro!

Então, nos meses seguintes, planejamos a viagem. Aos poucos, pesquisando o percurso, adquirindo utensílios e muito mais que passear pela ilha, saíamos para treinar. E com a experiência dele, como triatleta, montamos planilhas. A partir daí, já casados, e eu, morando há 10 km do trabalho, usando a bicicleta como meio de transporte e treinos, pedalando todos os dias 30/40 km. E durante os finais de semana nossos percursos mais longos, conhecendo cantos da ilha.

Data marcada, 03 de agosto de 2012. Mas chovia muito, e no dia 05 descobrimos uma janela de sol e o tempo prometia ficar muito bom por todo mês de agosto. Na manhã deste dia, partimos para nossa cicloviagem, cheia histórias pra contar, pessoas que conhecemos, que nos receberam, momentos incríveis, paisagens lindas.

provas de longa distância
Cicloviagens e provas de longa distância. Foto: acervo pessoal Patricia Barcellos

Foram 1.560 km desde a porta da nossa casa, até a casa da mãe dele, em Niterói. Todo o percurso pelo litoral de Santa Catarina e Paraná. Subimos a Serra da Graciosa e, pela Régis Bitencourt voltamos para o litoral de São Paulo e Seguimos pela Rio-Santos até chegar ao Rio pela Barra e atravessar de barca para Niterói. O retorno, de avião, porque as férias estavam acabando.

Em 2011, depois que voltamos da Bahia, fomos convidados a participar de um Audax 200 km. Encaramos o desafio e gostamos. Em 2012 Fiz o 200 km novamente e o 300 km. Em 2013, resolvi fazer a série até 400 km, mas não tinha jeito, estava gostando muito de pedalar longas distâncias e acabei concluindo toda série até 600 km.Este ano percorri 3.800 km em provas de Audax. Concluindo a série até 1000 km, meu marido e eu. Detalhe: eu, com uma MTB, aro 26.

Foram mais de 6.000 km pedalados incluindo ir e vir do trabalho e treinos de final de semana. Os quais nos levaram a conhecer lindas cidades e recantos de Santa Catarina e da Ilha de Florianópolis. Além disso, conhecer muitos ciclistas.

Como eu disse, minha paixão pela bicicleta começou tarde. Aos 39 anos eu nunca imaginaria participar de provas de longa distância e viajar de bicicleta. Até esta idade, ir de um bairro até o outro, só de carro ou ônibus. A perspectiva do meu mundo mudou e melhorou muito.

Liberdade é a primeira palavra que me vem à mente para definir o que é pedalar.

Até onde dá pra ir de bicicleta… Até onde a gente quiser!

Cicloviajando eu aprendi que longe é um lugar que não existe quando a gente se determina. Participando de provas de Audax aprendi que a mente é que faz o limite. Foco, treino e determinação nos levam a atingir o objetivo. E ainda, descobrir que podemos mais ainda.

E o território vai ficando pequeno, mas o nosso mundo vai se tornando grande!

Cicloturismo: de Curitiba ao Oiapoque!

Por Fernando Chotguis

Cicloturismo de Curitiba ao Oiapoque!

Meu nome é Fernando Chotguis Rosenbaum, 22 anos, curso a Escola de Música e Belas Artes do Paraná. Como ocorre com a maioria dos bikers, minhas experiências ciclísticas iniciaram bem cedo: ainda me lembro quando tirei minhas rodinhas de apoio na areia de São Vicente (SP). Pensando que o meu pai ainda estava me segurando, pedalei com segurança por um momento, mas quando virei, dando pela sua ausência, fui ao chão…

Mas o tempo passou, e conheci Hevandro Gonçalves no Encontro Nacional de Comunidades Alternativas, em 1999, quando combinamos de pedalar até o Rio de Janeiro, onde seria realizado o próximo encontro. Alguns meses depois, a Equipe cresceu com a chegada de Claudia Ponestick; proporcionalmente, cresceu a distância: fomos convidados a participar do Festival de Cultura Alternativa em Arembepe (BA).

Com pouca experiência, nenhum patrocínio e muita garra, partimos em direção à Bahia. Foram 45 dias entre o céu e o asfalto, mas tudo ocorreu da melhor forma possível. Concluímos nossa viagem de 2.700km de forma transcendental, com uma grandiosa chegada na Aldeia Hippie de Arembepe, em janeiro de 2000. Além disso, assistimos a semana de Shows na primeira fila e aquele eclipse total da lua cheia que ocorreu no início de 2000. Após o final do festival ficamos na aldeia mais uma semana, e no dia que iria partir tive duas surpresas: tinha sido aprovado no vestibular da EMBAP e a bicicleta que meu irmão me emprestou para fazer a viagem tinha sido roubada! Não tendo dinheiro nem bicicleta, não restou mais nada a fazer. Foi meu avô quem me acolheu por 2 semanas em Ponta Verde, bairro beira mar daquela cidade fantástica que é Maceió (AL).

No ano de 2000, trabalhei e comprei uma bike, a vontade de partir começou a crescer. Elaborei um projeto e levei à algumas empresas, tentando viabilizar um patrocínio para a aventura que foi batizada de Meridiano 50: uma viagem ousada pelo interior do Brasil cortando-o longitudinalmente; partindo do Trópico de Capricórnio alcançando em 50 dias a Linha do Equador em Macapá (AP), rodando 3.500km em minha primeira “Aventura Solo”.

Confesso que a partida foi difícil. Existe uma certa pressão pra você ir e ao mesmo tempo é difícil partir sozinho. Na manhã de 29 de dezembro de 2000, sem acordar ninguém, iniciei minha viagem. Carregava comigo um alforje que tinha uns 30 quilos de equipamento: panela, roupas, material de pintura, remendo de pneu, algumas ferramentas, uma barraca e um saco de dormir. Tendo um apoio da Ticcolor, o qual englobava o gasto em material fotográfico (14 filmes mais a revelação garantida), patrocínio de R$50 (do meu colega da Faculdade, Edson, o “Tako”) e a certeza que tudo o iria dar certo.

De Curitiba ao Oiapoque – Pedal na estrada

Fiz o primeiro dia deixando Curitiba para trás, pedalando empolgado demais até Ponta Grossa 150 km – aprendi que a minha média ideal era de 100km diários. Acordava às 6h, mais tarde tomava um café em alguma padaria. Nos Estados do Norte, com R$ 0,50 é possível se esbanjar – cada pão de queijo, língua de sogra, rosca assada ou frita (é tudo R$ 0,10) o café era sempre gratuito. Concluía dois terços da viagem pela manhã, meio-dia eu parava em algum posto de Gasolina ou Restaurante, já procurando uma boa sombra para o “sagrado cochilo”, deixando minha bicicleta na porta do estabelecimento, “descansávamos” por uns 15 minutos e antes de entrar e explicar minha situação para o gerente: – Bom dia, eu estou vindo de Curitiba, de bicicleta e quero chegar até o Norte, eu tenho pouco dinheiro, e gostaria de saber se o senhor pode me dar um almoço…

Na maioria das vezes eu ouvia:
– Senta aí, sirva-se à vontade, vai querer água, suco ou refrigerante?

Não podia exagerar na quantidade, indo à forra. Mais tarde, meu estômago sofreria trabalhando ao mesmo tempo que minhas pernas! Então dava um belo cochilo de duas horas marcadas no relógio, e quando o sol e a comida estivessem baixado, pegava a estrada até o pôr do sol e o início da noite; às vezes, por mais 20 quilômetros na escuridão para alcançar algum lugar seguro para pousar, e nunca acampando na beira da estrada. Geralmente dormia nos Postos de gasolina, onde tinha total infra-estrutura, banho, tanque para lavar a roupa e lanchonete, onde eu pedia uma marmita ou fazia um mingau de aveia com bolachas. Às vezes eu chegava numa cidade e ficava dando um “tempo para sorte”; esperava algo acontecer, na maioria das vezes conhecia alguém que me convidava para pousar em sua casa, acabava conhecendo a família, conquistando a amizade e no dia seguinte, quando estávamos muito à vontade, chegava a hora de partir!

Curitiba ao Oiapoque
De Curitiba ao Oiapoque. Montagem: acervo pessoal Fernando Chotguis

Na viagem, o meu peso variou de 64 quilos no início para 56 no meio do percurso e se estabelecendo posteriormente em 61 quilos. Em nenhum momento da viagem passei fome. Em trajetos de 70km sem civilização, carregava alguns alimentos de fácil preparo como arroz integral e aveia, também carregava bolacha recheada (juro que é o meu único vício), queijo, goiabada e doce de leite. Além disso, fui sendo presenteado pela viagem principalmente no Triângulo Mineiro. Haviam algumas cidades onde se produziam frutas em grandes quantidades, mas de um só tipo. Parecia que era a conjunção ideal de elementos na terra e clima, os quais faziam as frutas serem de tamanha qualidade. Nesses lugares frutas não faltavam. Existia também muita variedade, muitas frutas regionais como o buriti, jaca, cajá, acerola, seriguela e as várias espécies de manga. Os temperos e acompanhamentos que enriqueciam o feijão eram outra maravilha.

Cinqüenta e três dias entre o céu e o asfalto, rodovias tão compridas que levavam ao céu, cortavam montanhas, atravessavam rios caudalosos e algumas se assemelhavam a um grande rally. Muita vida havia nas estradas, revoadas de tucanos, araras-azuis, periquitos e anús; Falcões e grandes aves de rapina sempre voavam em casal; Tatus, lobos, lagartos e cavalos eram freqüentemente atropelados. Quando avistava de longe um grande animal peludo na estrada, já batia uma tristeza e ao se aproximar, vinha a certeza que estava mesmo morto: um tamanduá – bandeira, do tamanho da minha bicicleta, com garras maiores que meu dedo, tinham hábitos noturnos e eram lentos demais, havia também os tamanduás mirins (cheguei a contar 4 por quilômetro em Tocantins). Uma vez, quando pedalava numa estrada que cortava uma mata fechada, encontrei um mico fêmea, com um ferimento leve, ela estava no meio da estrada desacordada, então trouxe-a para a margem e dei um pouco de água; logo sua pupila se dilatou e ela correu para a mata.

Os Federais, como são chamados os andarilhos, estão por todo o lugar, e formam um verdadeiro povo caminhante, que cruza o Brasil com a sua Boroca (bolsa) ou seu papo de ema (espécie de saco com alça); levando sempre sua cascuda (vasilha) para acondicionar a comida que ganham. Eles têm um vocabulário próprio e dizem que têm propriedades e família, mas escolheram este jeito de viver; conseguem dinheiro pedindo para os caminhoneiros e igrejas, costumam beber e vivem à girar.

Cavaleiros montados sobre rodas são como lendas vivas, sempre se ouve histórias de aventureiros que foram vistos ou passaram por lugares, mesmo há dois ou mais anos ainda são lembrados. As pessoas se identificam com estes seres que procuram a liberdade e a imensidão como os garimpeiros. Elas também sempre contam histórias de suas viagens, mostrando o quanto são aventureiras. Às vezes eu era presenteado com livros, bonés, chapéus, dinheiro, anéis, colares, incenso, pomadas e camisetas como se quisessem viajar comigo, estando presentes em toda a minha jornada.

Recebi muito apoio no caminho. Nos jornais eu era entrevistado e podia explicar minha viagem direito; nas rádios locais me entrevistavam ao vivo; nas prefeituras conseguiam almoço e às vezes pouso. Quando era entrevistado pelas TV’s regionais as pessoas vinham apertar a minha mão e tiravam foto junto comigo, aí eu tinha meus minutos de fama.

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Entendendo que a grande função do cicloturismo é proporcionar a transição entre culturas, numa velocidade em que se possa compreender, eu fiz uma viagem para fora do meu horizonte, mas ao mesmo tempo mergulhei no meu interior; descobrindo a minha relação como o planeta, o tamanho da minha casa, o meu relacionamento com as pessoas que são como irmãos, o meu limite físico e a força do meu instinto de sobrevivência.

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Um dia enquanto eu estava tomando um farto desjejum numa manhã em um hotel 3 estrelas (fiquei em hotel umas 4 vezes, bancados por pessoas da mídia) eu pensei: O que eu estava fazendo era algo parecido com um trabalho de risco, passava o dia todo transpondo horizontes em compridos tapetes negros, alguns trechos em estado totalmente precário, disputando lugar com máquinas movidas a diesel, bufando fumaça preta e pesando mais de 60 toneladas com 10 rodas que se soltam pelo caminho. Tudo isso exigia total atenção, qualquer imprudência seria fatal. Mas o trabalho arriscado tinha a sua compensação – aonde eu chegasse, era rodeado por curiosos que lançavam perguntas, uma em cima da outra: se é uma promessa, uma competição, quantos pneus já gastei, quantos já furou, quantos quilômetros já andei, se eu me comunico com minha família, o que minha mãe disse disto e se eu não tinha medo. Daí eu dizia: – Medo do que minha senhora?
– Ah, medo de tanta coisa que a gente vê na Televisão. As coisas que aparecem na TV são na maioria notícias ruins!

Existe muita gente boa nesse mundo, uma pequena parte é que não presta. Eu ia levando essa esperança para toda a gente, mostrando que as coisas não estão tão ruins como parecem e que a coragem para fazer isso está dentro de cada um – não precisa viajar de bicicleta para ser corajoso!

Marcaram essa viagem, a diversidade, as culturas (riquíssimas), a vegetação (que foi se transformando), e os seres que habitavam as matas… Entendendo que a grande função do cicloturismo é proporcionar a transição entre culturas, numa velocidade em que se possa compreender, eu fiz uma viagem para fora do meu horizonte, mas ao mesmo tempo mergulhei no meu interior; descobrindo a minha relação como o planeta, o tamanho da minha casa, o meu relacionamento com as pessoas que são como irmãos, o meu limite físico e a força do meu instinto de sobrevivência.

Não fiquei sozinho no meio das pessoas, mas senti a solidão na estrada. Mas mesmo quando fazia dezenas de quilômetros sozinho, tive momentos de tremenda alegria e um sentimento raro de amplidão misturado com liberdade. Descobri que isso me faz muito bem!

No final do ano vai ter outra aventura. Penso que será pelo lado do nordeste – pedalar pelo sertão, onde existe muita cultura, história e até sítios arqueológicos.

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[Curiosidades] Bicicletas com nomes de pessoas

Tem gente que acha loucura, mas existem pessoas que dão nomes para suas bicicletas. entenda como é isso.

Trio de bikes

Tem gente que tem um apego imenso a certas coisas, e com as bicicletas não é diferente. A grande maioria mal sabe a marca/modelo da bicicleta que usa, mas os mais fanáticos chegam a “batizar” suas bicicletas com nomes de pessoas ou com nomes “diferentes”. E claro que este colunista e ciclista que vos escreve não foge a regra.

Mas por que isso? Alguns dizem que colocar nomes em objetos que se tem muito apreço é uma forma de lembrar de pessoas e/ou fatos que marcaram positivamente a determinadas pessoas. Com isso, é “normal” vermos bikes com nomes de artistas, de pessoas que já se foram ou que ainda estão entre nós, isso sem contar os nomes que remetem a fatos ocorridos e/ou personagens.

Atualmente possuo 7 bicicletas, e cada uma tem seu nome. Cada bicicleta que montei possui uma história por trás do nome escolhido, e como são “apenas 7” bicicletas, irei fazer uma série contando a história de cada bike em um post (dependendo do caso, contarei duas histórias em um mesmo post).

Enquanto isso, faço uma breve apresentação das “minhas meninas”:

Caloi Aluminum Sigma ErikaCaloi Aluminum Sigma (“Erika”)

Caloi Aluminum Supra JulianaCaloi Aluminum Supra Aerolight  (“Juliana”)

Alfameq Stroll The CamelAlfameq Stroll (“The Camel”)

Caloi Aluminum Extra GabyCaloi Aluminum Extra (“Gaby”)

Caloi Aluminum Extra SimoneCaloi Aluminum Extra (“Simone”)

Gios XC E-Line Black CrusaderGios XC E-Line (“Black Crusader”)

Caloi Aluminum Extra Black SheepCaloi Aluminum Extra (“Black Sheep”)

Além delas, tem outras bicicletas que passaram por mim que “foram batizadas”, mas logo foram vendidas e/ou desmontadas.

Ficou curioso/a? Então aguardem os próximos posts 😀
See ya!

Texto fotos e edição: Kiko Molinari Originals®

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Uma vida de viagens e aventuras com a bicicleta

Por Paulo Salvador Sanches

Viagens e aventuras com a bicicleta. 1979 – de São paulo a Buenos Aires

É longa, começou em 1979! Decidi que não ia aguentar a mais ficar horas por dia no trânsito de São Paulo, dentro de ônibus cheios. Morava no Ipiranga, trabalhava na Brigadeiro Luis Antonio, e estudava no Equipe, perto do centro da cidade. Peguei minha carteira assinada, e fui de “busum” até um [supermercado] Jumbo Electro da vida no Sacomã, e sai de lá pedalando uma Peugeot, 10 marchas.

Não tinha ideia que minha vida iria mudar depois desse dia. Não existia ciclovia, todo mundo me achava louco, mas eu virava São Paulo de ponta cabeça, dia e noite. Não demorou muito, São Paulo ficou pequena, não existia mais trânsito nem contramão.

E a primeira viagem pro Guarujá foi debaixo da maior chuva, Estrada Velha em obras, tive que desobedecer ordens de voltar no trecho da Serra, e quase fui preso em Cubatão… Fui várias vezes pro litoral mas sempre de noite. Estrada Velha na contramão porque só podia subir nesse tempo, não sei como é hoje.
Foi passando do o tempo, a bicicleta era (e ainda é) meu principal meio de transporte na cidade. Meus horizontes se expandiram. Fui pra Camburi, São Sebastião debaixo da maior chuva, pela praia depois de Bertioga não existia a Rio-Santos. 11 horas de pedal. Dia a dia fui ficando cada vez mais apaixonado pela coisa.

E numa noite em 1979, meu amigo Piu sugeriu uma viagem pra Argentina no fim do ano. De carona. Algumas cervejas depois, veio a tona a ideia de ir de bike. Aquilo ficou no ar até a manhã seguinte, quando nós dois nos encontramos cedo, empolgados com a aventura. A ideia amadureceu, e passadas algumas semanas, saímos de São Paulo, rumo ao litoral, Praia Grande, Mongaguá, Itanhaém, Peruíbe, Pedro de Toledo, até a Br 101 (acho que é 101), rumo a Curitiba. Depois seguimos Joinville, Itajaí, Floripa, Torres, Porto Alegre, Pelotas, Rio Grande, Chui, Uruguai, até Montevideo, Colonia, e um barco até Buenos Aires.

Não me lembro direito quanto tempo, mas foi perto de um mês acredito. Nesse tempo a Argentina vivia tempos de ditadura militar, como também o Uruguai e o Brasil. Mas na Argentina ninguém podia ter o cabelo comprido, e fomos revistados e levados pra interrogadores várias vezes. Detalhe até agora não comentado: nós não tínhamos dinheiro nenhum, viajávamos batalhando rango e pousada. Muita fé e coragem na juventude. Nesse tempo o peso argentino era MUITO mais forte que a moeda Brasileira, acho que era cruzeiro nesse tempo. Nós vendemos nossas bikes em Buenos Aires e voltamos pra Sampa de ônibus. Fomos entrevistados por algumas revistas (agora eu só me lembro da Duas Rodas, tenho uma copia até hoje em algum lugar).

Viagens e aventuras com a bicicleta. 1980/81 – de São Paulo a Santiago

De volta a São Paulo e a rotina do dia a dia não demorou muito. Voltei à mesma loja no Sacomã, e dessa vez sai com uma Monark 10. Voltei a estudar e trabalhar, e minha bike era meu transporte. Fins de semana e feriados. Fui pra Ubatuba, 250 km se me lembro bem. 24 horas de pedal. Me lembro de sair de São Paulo as 11 da noite, radial Leste. Moji das Cruzes, não me lembro mais os nomes mas acho que e Paraibuna, descida da Serra pela Estrada da Petrobras atá São Sebastião, maior chuva o dia inteiro, pneus furados, pedais se partindo, foi uma luta.

Bom, minha vida tinha mudado de verdade, e no verão de 1980 não me lembro como, mas a ideia de ver o Pacifico amadurecia na minha cabeça e no começo de dezembro, meus amigos Ronaldo Duarte, e Tadeu Maria Conceição e eu saímos de São Paulo com direção a Ibiuna, Piedade, descemos pra Juquia, estrada de terra, Jacupiranga, BR 101. Saímos do Brasil por Chui, Montevideo, Buenos Aires, Ruta 7 , por Luhan, Junin, Labouialle, Mercedes, Mendoza. Ai veio os Andes, dois Dias subindo, cruza pelo tunnel a 4000 metros de altitude. Descida pelos caracoles, até Vina Del Mar, Valparaiso. Inacreditável travessia das Montanhas. Verão no Chile em janeiro de 1981! Até dar a saudade de casa, e depois de uma semana em Santiago, conseguimos arrumar a grana pras passagens de volta pra São Paulo. 72 horas de ônibus, ano de 1981.

Uma vida de viagens e aventuras com a bicicleta
Uma vida de viagens e aventuras com a bicicleta. Foto: acervo pessoal Paulo Sanches

Viagens e aventuras com a bicicleta. 1982 – de São Paulo a Los Angeles (CA)

O verão acabou, a vida batia a porta, eu não sabia o que fazer dela. Fui trabalhar no banco Boa Vista, centro de São Paulo, e depois de ter abandonado a faculdade de Ciências Sociais da USP, voltei a fazer cursinho a noite no Anglo, querendo realmente encontrar um rumo. Mas eu não conseguia ter Paz usando gravata, e não perdia nenhuma oportunidade de sair de São Paulo. E ai veio a ideia de ver a Copa do Mundo na Espanha. Essa ideia me consumir por algum tempo até eu perceber que não existia nenhuma possibilidade de um cara como eu conseguir a grana pras passagens aéreas e ainda se manter na Europa por um mês e tanto. Então o Nardo, o Ronaldo Duarte , falou assim do nada: “Paulão, vamo pros States, lá a gente descola uma grana pra ir pra Espanha”. Eu fui buscar o mapa, fiz pesquisas, fui ver os mapas da Polícia Rodoviária Federal, via Panamericana… E vi que era possível. Eu nunca tinha ouvindo falar de ninguém que fez essa viagem, mas lembro de ter visto na tv um Mexicano nos anos 60.

Bom a ideia nasceu para a viagem pra California. E muitos amigos acharam o máximo, e todo mundo queria ir também. Mas não é assim. Uma travessia dessa requer planejamento e organização, começa pelo passaporte que eu não tinha, e o visto Americano. Não foi fácil. E a grana também. Nas duas viagens anteriores, quase sem dinheiro, isso nunca atrapalhou, porque as pessoas ajudam a quem precisa e tem boa atitude. Mas essa viagem seria MUITO maior do que qualquer outra que eu já teria feito. Eu comecei a economizar. Foi MUITO duro pra minha família e pra mim também, mas vários fatores colaboraram na minha decisão, e depois de tomada, não haveria volta.

Um por um , meus amigos e amigas desistiram da ideia. Eu já esperava por isso, mas de repente só tinha sobrado eu, e eu repensei a coisa toda. Até que meu grande amigo Antonio Vidal Fernandez, o Cacalo, craque de bola, gente fina, passou em casa uma noite e disse que iria junto comigo. Eu sabia que o cara era de fé, o lance é que ele nunca tinha tido uma bicicleta na vida. Nem sabia andar de bike. Gigante descolou uma Peugeot brasileira, e começou a andar. Me lembro de dois tombos espetaculares, um no museu do Ipiranga, outro perto do poço do Jaraguá.

30 de janeiro de 1982, um domingo de manhã cruzamos o Parque do Ibirapuera, a galera nos seguindo, pra Ibiúna, Sorocaba, Itapetinga, Ourinhos, Presidente Prudente, Campo Grande, Corumbá. Trem da morte pra Santa Cruz de la Sierra, Cochabamba, La Paz. Cordilheira, Puno. Já no Peru. trem pra Arequipa.Pacifico. Pisco, Ica, Lima, Trujillo, desertos, equador em cima do trem que faz zig-zagues de volta pras Montanhas… e que Montanhas… até Quito. Montanhas magnificas,  inacreditável descida ate Cali, na Colômbia, e depois Medellin. Norte da Colômbia até Turbo. Fim da estrada.

Daí, só de barco até Sapzurro, fronteira com o Panamá, Puerto Obaldia, algo assim.

Encalhados e sem grana no meio das Américas, conseguimos depois de muita sorte embarcar num avião pequeno até Panama City. Lá recebemos uma grana, descolamos, rodas, corrente e catracas novas. Já havíamos trocado as correntes em Quito também. Com as magrelas reformadas, limpos e com uma merreca no bolso, cruzamos a Costa Rica e Honduras. Tivemos que desviar de El Salvador porque estavam em guerra e os caminhoneiros nos disseram que nos não passaríamos. San Pedro sula não e um lugar agradável.

Até Guatemala City, pension meza onde Che Guevara se hospedou. Costa do Pacífico até Tapachula no sul do Mexico, onde vimos o Brasil perder da Itália com 3 gols de Paolo Rossi. Ficamos tão desolados com a derrota que ficamos uma semana em Puerto Escondido, pegando ondas, até criar coragem pra subir de Acapulco pra Cidade do México. Outro planeta. Por Guadalajara, Norte do México, Puerto Vallarta, Chihuahua, um calor infernal. Até a fronteira, Mexicali foram exatos 6 meses de viagem.

Cruzamos , tínhamos 15 dólares entre nós 2 e eu não falava uma palavra de inglês. O Cacalo tinha feito um Yazigi da vida e entendia alguma Coisa. Até San Diego, onde ficamos maravilhados coma limpeza e organização. Foi um choque cruzar do Norte do Mexico pra California. Nunca vou esquecer a sensação.

De San Diego pra Los Angeles, dormindo em Laguna Beach, num templo Hare Krishna com direito a café da manha. Dessa história se passaram mais de trinta anos… Tenho muitos outras histériaas: viagem pra Jamaica, viagem pra Cabo San Lucas, Portugal e Espanha. Outra viagem pra Argentina desde Porto Alegre em 1990. Hoje tenho 4 filhos, Moro na ilha do Hawaii, tenho minha Caloi 10 até hoje, só tirei os câmbios.

O que eu tenho a dizer – se alguém quiser saber – é que nada é impossível.

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